Vale a pena deixar o Brasil?

Vale a pena deixar o Brasil?

Uma resposta para quem teme deixar a família, ter saudade ou sentir culpa por nunca tentar.

Um tempo atrás eu me fiz a pergunta contrária: vale a pena ficar no Brasil? A resposta eu não achei. Na dúvida, resolvi tentar descobrir na prática.

Já sei respondê-la quando me perguntam? Não. Vou saber um dia? Tenho quase certeza que não.

O bom desse monte de nãos que eu encontrei pelo caminho é que descobri que são muitas as variáveis nesse processo. Cada um tem as suas. Dificilmente a mesma fórmula serve para todos.

Para dar um exemplo, depois de um tempo aqui em Portugal e fazendo amizade com brasileiros nós sempre ficávamos de fora do assunto da chegada no país. Por quê? Porque temos cidadania europeia e praticamente todo mundo que conhecemos veio como turista e conseguiu emprego aqui ou já chegou com a promessa de trabalho. Nossa chegada não foi a mesma, nossos documentos também não. Eu jamais poderia dizer para alguém que é fácil vir e se legalizar, porque a minha situação é uma que não se aplica para todo mundo.

O mesmo vale para a pergunta sobre deixar o Brasil. Vale a pena? Depende.

E depende porque as pessoas não analisam a fundo seus motivos. Vejo isso quando me dizem que eu que tenho sorte por estar aqui, que eu não sei o que está acontecendo por lá. Normalmente, falam que não aguentam mais o Brasil, porque os impostos estão insuportáveis. Gente! Se você pensa que esse é um bom motivo, eu só posso recomendar uma coisa: estude como funcionam os impostos nos outros países. Sei lá, Estados Unidos, Portugal, Alemanha. A internet está aí e nos conta quase tudo. Você pode ficar assustado com o que vai descobrir.

Bom, daí sempre tem aquele que diz, ah, mas o problema é que eu não me importaria de pagar impostos se eu tivesse retorno. Mais uma vez: que tipo de retorno? Volta lá e continua a pesquisa para saber como é o sistema de saúde na América, na Suíça, na Espanha. Não tem milagre na conta.

E outra coisa: das pessoas que eu conheço que me falam em sair do Brasil, se fosse oferecido a elas um aumento de impostos com garantia de serviços básicos eu sei que elas só teriam uma resposta: deixa assim que eu mesmo administro o meu dinheiro. Pois bem, saiba que você já tem feito isso, porque tem país que todo mundo acha incrível, mas cobra um absurdo de imposto e ainda por cima te obriga a ter plano de saúde e aposentadoria privada. Exatamente.

Aqui em Portugal, sempre que me perguntam, eu dou a realidade: as grandes cidades estão saturadas, não estavam preparadas para toda essa demanda. Já há um tempo aqui, eu e a minha família ainda não temos médico no centro de saúde na qual fomos instruídos a nos inscrevermos (em outra cidade, porque os da nossa estavam lotados).

Isso significa que não podemos marcar consultas, apenas somos atendidos no plantão (que não encaminha para exames e nada mais complexo) ou na emergência. Precisamos do hospital algumas vezes. O atendimento foi muito bom, relativamente rápido. Mas é tipo SUS, gente pelos corredores. Se você está acostumado a ter consulta marcada, médico habitual, vai precisar um plano de saúde como precisaria no Brasil. Pelo que sei, as mensalidades não são tão caras, mas as coparticipações pagam o resto da conta, fora que muitos dos hospitais privados nem UTI tem. Fica sempre aquela dúvida do que fazer.

E a educação? Depende de novo. As escolas públicas aqui não são tão complicadas como são as do Brasil, mas também têm muitos problemas. Dependendo da região do Brasil de onde você vem, uma escola privada aqui pode custar a mesma coisa, mas as de Porto Alegre — de onde eu sou — não são tão caras quanto as que eu vi em Portugal.

Optando pela educação pública, saiba que precisa escolher um bom bairro para viver, porque o agrupamento de escolas é baseado na região onde você vive e se for insegura, bom, você já imagina o que seu filho pode encontrar. Não é só no Brasil, é em todo lugar que o “me diga com quem andas que te direi quem és” funciona.

Falando em morar, Portugal e muitas grandes cidades da Europa — Estados Unidos nem vou comentar porque já faz tempo que é caro morar lá — estão enfrentando dificuldades. Não há moradia para todos. Os locais não conseguem pagar pelos exorbitantes alugueis impostos, os proprietários que não enfrentam os alugueis vitalícios — que chegam a render menos de 80 euros por mês no meio de Lisboa — exigem até três anos de comprovação de Imposto de Renda português, fiador, 3 ou mais aluguéis adiantados. Um apartamento de dois quartos decente em Lisboa está na faixa de 800 euros por mês.

Para lembrar: o salário mínimo português é de 580 euros bruto. Daí você pergunta, gente, como é que paga as contas? Não sei também.

Por isso que eu falei desde o começo: vale a pena? Depende. Do quê? Da sua situação, de quanto tem guardado, de quanto ganha e se sabe de todas essas coisas quando se muda. Se tem filhos, se tem cidadania ou se vai ficar na mão de um empregador quando chegar aqui, se vai fazer um intercâmbio ou se é pai de família. Mas acima de tudo, depende da sua motivação.

Mas para mim, o mais relevante é se fazer aquela pergunta: vale a pena ficar no Brasil?

Eu confesso que quando comecei a planejar a partida estava muito desesperançosa. Logo antes de vir, muita coisa se ajeitou e veio aquela dúvida: será que não vou sentir culpa depois? Culpa por ter deixado um ótimo emprego, a família, a vida maravilhosa que eu tinha? E será que não vou ter depressão por causa da saudade? Vale a pena levar toda a turma nessa aventura?

Até agora só posso dizer que valeu. Não sou mais a mesma pessoa e tenho até um pouco de receio quando penso em ir ao Brasil e ter que ouvir isso quietinha e concordar: você mudou. Sim. Mudei muito e acho que foi a melhor parte da minha decisão → Deixar o medo para trás. Isso me tornou outra pessoa.

Eu, que fui das maiores medrosas que já existiu, posso garantir que não tem sensação melhor. Então se esse é o seu motivo (insegurança), eu acho que você precisa tentar. Muita gente daqui de Portugal ainda me diz que queria muito morar no Brasil, que não sabem porque a gente vem para cá. Falam que entendem nosso medo da instabilidade política e econômica e tal, mas não adianta, só quem sentiu MEDO sabe do que os brasileiros mais temem.

Por isso, eu entendo você que diz que não está nem aí para o que eu falei sobre os impostos, sobre a saúde ou qualquer outra coisa. Eu sei que você está desesperado. Eu sei que você trabalha dia e noite para pagar as suas continhas e vem alguém e rouba o seu celular, o seu carro, entra na sua casa e pior de tudo: te deixa apavorado para sempre (como eu, que muitas vezes, quando o meu marido viajava, chegava a ligar de madrugada para o meu sogro vir até o meu pátio porque eu tinha ouvido um barulho e tinha vergonha de chamar outra vez a segurança para constatar que não havia nada).

Como eu disse, nem que eu quisesse te dar todas as dicas do mundo, a minha situação não é a mesma da sua. Eu já falei muitas vezes, mas vendo as minhas fotos, nem os amigos entendem. Se você pretende morar em Orlando, na Flórida, a probabilidade de ir na Disney todos os dias é muito baixa (a menos que esteja trabalhando lá). Morar fora não é férias. Mas estar em paz é muito bom e não tem preço.

Eu sou defensora de que essa viagem permanente do imigrante não pode ser feita com segredos, com ilusão e mentiras, sonhando com as bobagens que muitos dizem por aí sobre viver com meia dúzia de euros ou dólares. Em pleno 2018 tem gente desesperada que ainda tenta atravessar a fronteira dos Estados Unidos acreditando no que os outros dizem. Valorize o que você tem de mais precioso: a vida: SEMPRE peça informações para as autoridades e não para o primo do amigo do vizinho que foi morar lá não sei onde e não sei como.

Se o lugar para onde você quer ir não dá, pesquise outros países. Não é só EUA e Portugal nessa Terra. Desvende o mundo, mas não deixe o medo te dominar.

Procure pelo que procura e precisa de você, em qualquer situação da vida. O resto não vale a pena.

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